Tornou-se o
tema do Verão (e provavelmente do Inverno, Outono e próxima Primavera) o uso ou
não uso, a proibição ou não proibição, do burquini. Confesso que tenho
tendência concordar com a proibição. Posso até listar as razões que me levam a
concordar com a proibição. Primeiramente assolam-me várias dúvidas se o uso da
burqa e burquini são opção da mulher ou da sociedade machista onde se inserem.
Mas ainda me incomoda mais o facto de o Alcorão nunca mencionar o uso de niqab
ou burqa. No livro sagrado dos seguidores de Maomé, recomenda-se apenas que as
mulheres tapem os adornos e a palavra é zinah ( versículo
24: 21, Alcorão). E posso juntar a esta lista a defesa da laicidade porque,
e isto é inegável, o burquini é um símbolo religioso numa sociedade laica. Mas
a verdade é mais profunda. O uso do burquini ofende-me. Ofende-me porque se
baseia na “modéstia” das mulheres, essa palavra que significa neste contexto a
glorificação do pudor mais bacoco, como se o corpo fosse pecaminoso e, por
isso, as mulheres decentes têm de o tapar. Assim o uso do biquini, pelo mesmo
pressuposto, revela imodéstia, despudor, um comportamento não adequado à
condição feminina. Provavelmente nada disto me devia importar. Provavelmente
devia ser tão moderna que os conceitos sociais de uma visão medievalista do
Mundo não me deviam perturbar. Mas perturbam. Ofendem. Na minha visão
etnocêntrica, à qual tenho todo o direito, a atitude de modéstia que leva a
tapar o corpo cataloga-me como mais uma ocidental que não tem valores morais e
que se sujeita a mostrar o corpo a pessoas que não são da sua família. Décadas
de liberdade sexual, de luta pelos direitos, de muros sociais que esbarram
nesta sociedade medieval, autoritária, machista, perturbante. Vale então a pena
proibir o burquini? Não. A sua proibição não vai alterar absolutamente nada e
vai restringir ainda mais a liberdade às mulheres vítimas da sociedade machista
onde se inserem. Mas os Estados laicos têm de combater ideologicamente o Islão radical.
E não podem tolerar imãs e mesquitas onde se propaga o discurso do Islão
radical. Os Estados laicos não podem admitir que a lei sharia impere em
bairros. Não pode pactuar com agregados familiares ou sociais onde se imponham
o véu à mulher. A tolerância ao fascismo islâmico deve ser zero. E quanto ao
burquini, por muitas voltas que dermos, é uma peça de vestuário feia,
horrorosa, inestética. E, modestamente, recuso-me a aceitá-la.
segunda-feira, 12 de setembro de 2016
terça-feira, 22 de dezembro de 2015
Mulheres na política precisam-se. E já.
Várias vezes me questiono porque é que as mulheres não estão na política. Consigo perceber que a
que a realidade social é diferente para homens e mulheres porque,
pasmem-se, também sou mulher, e que para nós mulheres, o peso da família, do
cuidar dos nossos e das nossas coisas, ainda é pesado, leva-nos tempo e
energias. Mas deixem-me contar-vos uma
história. Há duas semanas, num daqueles muitos jantares de Natal que deviam ser
proibidos constitucionalmente, a mesa estava quase paritária. Jantou-se,
falou-se de temas banais, e no fim os homens levantaram-se para colocar os
pratos na cozinha e as mulheres, instintivamente, começaram a lavar e arrumar
loiças e tudo o mais. Até aqui tudo normal, dentro de um certo pressuposto de
normalidade. O que me fez parar para pensar não foi isto, foi o que se passou a
seguir. Os miúdos estavam a ser miúdos ou seja a gritar e a infernizar a festa,
e um dos putos estava a dar rodas e
voltas no chão . Quando uma das miúdas, pequenita da mesma idade, se junta no
chão a fazer rodas e coisas barulhentas a mãe coloca-se em campo, levanta a
miúda do chão e diz bem alto “ Pára
quieta já.comporta-te como uma menina”. E vira-se para nós e diz “ credo, que
elas hoje são piores do que eles”. E aqui está o problema. É que
quando aquela menina crescer e disser mais tarde à sua filha para se comportar
como uma menina, é porque nós mulheres deixámos que isso acontecesse, eu mais
que incluída. Nós mulheres, que ficamos sempre na sombra quando somos chamadas
a intervir, contribuímos para que as diferenças de género não se esbatam e
dizemos àquela menina que pode fazer menos do que o amiguinho do lado porque o
seu espaço natural é de reflexão e recolhimento e o do menino de caos, barulho
mas de intervenção. Na política quando
não assumimos o espaço que nos está reservado e que foi arduamente conquistado, então somos
nós quem está a dizer às próximas gerações que há comportamentos de meninas
e comportamentos de meninos e a política
é para os meninos porque nós temos “ mais que fazer”. Se queremos e exigimos paridade temos de dar, literalmente, o corpo
ao manifesto. É nossa obrigação zelar para que as novas gerações de mulheres e
homens não tenham medo de falar, de dizer não, de assumir diferentes papeis sem
se preocupar se convém ou não ao seu género .É nossa obrigação de contribuir
para um tempo justo.
terça-feira, 27 de outubro de 2015
Porque não podia ser de outra maneira.
Porquê a política Marisa? Porquê agora? Não estás farta? O teu partido
agora vai fazer o quê? Ainda andas nisso? Mas "isso" agora é todos os
fins-de-semana?
São estas as perguntas seguidas e repetidas numa cadência quase igual e
quase diária. Porquê agora, mulher de 35 anos, que podias ter uma vida tão
calma e tão familiar e que agora, porquê
agora, andas metida “nisso”? Porque não pode ser de outra maneira, porque
tentei de todas as formas adaptar-me ao que os outros esperavam de mim e vivi
na ilusão de que esta ansiedade de mudar o mundo passasse. Mas não passou e a
gente que passa por mim é a gente que que eu também sou. E a gente que passa por mim é também aquilo que eu vivi e não consegue não
intervir, não pensar e não agir. O preço a pagar é caro e continua a ser caro
porque poucos percebem “isto” no meu país ainda tão pequenino onde as fotos
dos filhos, do marido e da família são a ocupação primordial e total de
mulheres como eu. E querer mais do que uma família ou um emprego bem remunerado
ou, pior!, deixar tudo isto em nome da política que não me dá emprego mas só
chatices, que não me dá fama mas só discussões, é querer o direito a respirar
plenamente. A intervir. A ouvir e a ser ouvida. Ter voz e deixar que a voz dos
outros flua. Debater à esquerda e à direita. Querer que a democracia não passe
por mim mas eu também faça parte da democracia. Seja qual for o preço a pagar a
liberdade de pensar, agir e intervir não tem preço. Não tem.
Esta Gente
Esta gente cujo rosto
Às vezes luminoso
E outras vezes tosco
Ora me lembra escravos
Ora me lembra reis
Faz renascer meu gosto
De luta e de combate
Contra o abutre e a cobra
O porco e o milhafre
Pois a gente que tem
O rosto desenhado
Por paciência e fome
É a gente em quem
Um país ocupado
Escreve o seu nome
E em frente desta gente
Ignorada e pisada
Como a pedra do chão
E mais do que a pedra
Humilhada e calcada
Meu canto se renova
E recomeço a busca
De um país liberto
De uma vida limpa
E de um tempo justo
Sophia de Mello Breyner Andresen, in "Geografia"
Às vezes luminoso
E outras vezes tosco
Ora me lembra escravos
Ora me lembra reis
Faz renascer meu gosto
De luta e de combate
Contra o abutre e a cobra
O porco e o milhafre
Pois a gente que tem
O rosto desenhado
Por paciência e fome
É a gente em quem
Um país ocupado
Escreve o seu nome
E em frente desta gente
Ignorada e pisada
Como a pedra do chão
E mais do que a pedra
Humilhada e calcada
Meu canto se renova
E recomeço a busca
De um país liberto
De uma vida limpa
E de um tempo justo
Sophia de Mello Breyner Andresen, in "Geografia"
segunda-feira, 19 de outubro de 2015
Sem medo, sem medo, sem medo.
Setembro, campanha eleitoral. Contavam-se os dias um a um,
uma cidade por cada dia sem esquecer Açores e Madeira. Distribuíam-se jornais
em todas as estações de metro onde houvesse vontade, davam-se papoilas para que
brotassem as ideias, falava-se da vida,de política e até do tempo a quem
parava para nos ouvir. E ouviam-se as histórias do costume, infelizmente as
histórias do costume :que o marido estava desempregado e o filho emigrado. Que
tinha de ir para casa tratar da mãe acamada. Que a reforma dos pais era o único
sustento da casa. Que a filha tinha tirado um curso e não tinha emprego. Ouvimos
tudo isto, quase todos os dias, entre a indiferença pela política porque são todos iguais e a raiva latente. Mas não ouvi uma ideia, uma proposta concreta,
uma tentativa de revolução. Que se passa com este país, o meu país, que deixa
na mão de outros a decisão sobre as suas vidas? Não pode ser a velha desculpa
do salazarismo, não pode ser a velha desculpa de uma moral católica. Não pode
ser porque aqui ao lado nuestros hermanos
saem às ruas e viram o voto para partidos que lhes dão propostas de esperança.
E aqui, neste cantinho que nem ser é plantado à beira-mar, a indiferença
permanece como a bruma nos dias de nevoeiro. Até que algo abana a ordem
estabelecida. Pela primeira vez coloca-se a hipótese de um governo de coligação
de esquerda onde os votos contam. Onde o eleitorado de esquerda acredita que é possível
governar. Foi o LIVRE que lançou a semente, mas não foi o LIVRE que colheu os
frutos. Que importa isso? Absolutamente nada. O que importa é esta
possibilidade de esperança, esta pedra no charco, este abanar das instituições.
Talvez seja o momento em que se quebre a apatia, em que se respeite o voto de
todos, onde seja possível quebrar o arco da governação. E se em Setembro os
dias foram contados um a um, agora são as horas e os minutos. Porque é a
política e as suas ideias a única garantia da democracia e de liberdade, seja qual
for o resultado destas eleições. Sem medo. Sem medo. Sem medo.
domingo, 11 de outubro de 2015
Agradecimento ao delinquente que me roubou a mala a noite passada
Caro Ladrão ou Ladra ou grupo de profissionais do crime.
Estou um bocadinho aborrecida pelo roubo da minha mala de
ontem à noite. Não que ponha em causa o vosso trabalho, claro está, mas porque
o vosso trabalho incidiu sobre a minha pessoa. Admito desde já a excelência do
vosso profissionalismo, ninguém na mesa se apercebeu do roubo nem senti a mais
pequena brisa enquanto o meu saco com todos os meus pertences me era extraviado.
Mas é aborrecido ficar sem a chave de casa e do carro, sem dinheiro para pagar
a conta e sem forma de ligar a ninguém. Até eram horas decentes, 00h30 , é de
facto bastante decente para um roubo.
Mas foi chato ter de ir dormir a casa alheia e pedir dinheiro emprestado.
Esperem, a parte do dinheiro não é assim tão chata. No entanto, não vos estou a
escrever para me queixar mas sim para agradecer o abandono das chaves e dos
documentos: foi muito agradável não gastar quase 1000 euros em chaves novas
para o carro e foi muito bom poupar a manhã na loja do cidadão. Quanto aos
cartões bancários lamento ter de os anular mas também depois de verem as minhas
contas bancárias a vossa depressão seria maior que a minha. Quanto aos 15 euros
que estavam na carteira espero que o tenham gasto em álcool ou outras
substâncias, afinal estávamos na noite e a malta quer se divertir, delinquentes
incluídos. Foi só aborrecido porque a noite estava a ser tão divertida, já me
estava a arrastar para o plateau e, de repente, vou para a esquadra de polícia
onde descobri que me chamo Marisa Figueiredo quer eu queira quer não. Também
foi chato ir novamente à esquadra hoje, não porque os polícias não sejam
amorosos (e foram), mas porque estava a começar o Portugal-Sérvia e isso é
chato. Para terminar lamento terem roubado um telemóvel partido. Se me dessem
mais uma semana tinham um com o vidro arranjado. Quanto às fotos também não são
interessantes mas prometo, a partir de hoje, ser alguém mais interessante para
o meio delinquente. Obrigado por abandonarem o saco com os meus documentos e
desejo que o telemóvel vos renda algum dinheiro. Bjs. A roubada, Marisa.
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