terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Lance Armstrong: culpado ou vítima dos tempos?

Resposta à pergunta: culpado. Culpado, culpadíssimo, extra culpado. Vi, com muita atenção, a entrevista que o ciclista deu à Oprah. Foram duas horas e meia de ataque, perguntas directas e pouca margem para escapatória. E o resultado é só um: Lance Armstrong é batoteiro, arrogante e mentiroso até ao último grau.
No entanto, houve algo que me faz atenuar o meu próprio julgamento de Lance Armstrong.  A certa altura, o ciclista fala da cultura dos anos 90. E se há coisa que eu me lembro muito bem foram os anos 90. 
Os anos 90 foram os anos da cultura do sucesso. Não havia crise económica nenhuma e todos os filmes e todas as séries falavam de sucesso. Falavam do sucesso na banca, falavam da família perfeita, falavam de histórias do pobrezinho que se tornou milionário. Todos vibrávamos com Beverly Hills 90210,o grupo de betos que sofria com o sucesso. Friends retratava o grupo de amigos que sofria de amores e injustiças mas  que atingia a felicidade  monetária e pessoal no fim da história. E de filmes, basta citar Wall Street.  Quem não se lembra da ganância da bolsa, a tentativa de atingir o sucesso a qualquer custo?  O bem ganhava, mas o sucesso era demasiado tentador  e  este filme foi, para tantos, uma escola de vida.As revistas femininas, masculinas e  as do coração apresentavam os empresários  e as empresárias do ano,  davam conselhos sobre como subir na carreira e conselhos sobre como nos devíamos vestir para subir no escritório. Haviam cursos de sobrevivência para empresários, com treino militar, para que estes não sucumbissem às emoções mas fossem duros e implacáveis a negociar. E a Católica formava os nossos implacáveis gestores de sucesso, os CEO do futuro. Foi o tempo em que a escala da nossa vida era medida pelo bom emprego que tínhamos ou não, pelo dinheiro  que tínhamos ou não, pelo sucesso que tínhamos ou não. E ganhar era a palavra de ordem.
Ganhar na vida como no desporto. Ser implacável e atingir o objectivo final. Ganhar sempre. Ter sucesso sempre.
Não quero com isto desculpar o Lance, como é óbvio. Quero apenas que reflictamos que nós ,como sociedade, aceitamos e assumimos um modelo. E esse modelo, quando aplicado, pode trazer consequências feias e que depois negamos, como se nós não percebêssemos o que se passou e nenhum de nós , alguma vez, pudesse ter tido aquela reacção. Não acredito em culpas colectivas, nada disso. Mas também me aflige a subida idolatrada de um anjo e a queda de um demónio. E creio que todos nós, como sociedade, devíamos pensar mais na substância das coisas do que no folclore que as rodeia.
Lance é culpado? Absolutamente. E nós, como sociedade, somos inocentes? 

"O sucesso: / entre os mortais, este é um Deus  ou melhor, mais do que um Deus."

Ésquilo, as Coéforas.

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