Nasci com horror ao preconceito, o que é um erro grave na
minha pequena sociedade. Desde sempre achei que as pessoas devem amar quem
entenderem, casar com a cor que entenderem, viver da forma que lhes apetecer.
Sempre entendi demasiado bem todos os que são estranhos nesta sociedade, talvez
porque eu própria também não sou nada normal. Eu sou demais no pior sentido da palavra para os outros: falo alto demais,
expresso-me demais, gesticulo demais e até tenho cabelo a mais.
Por isso, numa sociedade em que a calma, o respeito pelas
convenções, o saber passar pela vida devagar é muito apreciado, eu sou uma ave
rara, mas daquelas que incomodam. Mas não incomodo tanto quanto os homossexuais
e os casais com cores diferentes. Ainda hoje, nos muitos cafés por onde deambulo,
ouvi uma senhora a comentar para o marido que " aquela rapariga tão linda a namorar com um preto". Nem sequer
vou fazer a apologia do que o preto era bonito, porque nem era. Mas ela olhava
para ele, e ele para ela, como se olham todos os casais apaixonados, em todos
os lugares do mundo, tão vasto, tão enorme e tão maior. A senhora e o marido
não viram, ou não quiseram ver, como ele lhe pegava na mão, como ela se embevecia
quando ele lhe falava. A senhora e o seu marido só viram que o filho ia ser mulato" mas até há mulatos bonitos".
Estas conversas deixam-me triste por perceber que nem o amor é imune ao
pre-conceito do que deve ser, do que é suposto ser. É como as conversas sobre
os casamento gays, em que há sempre a piadinha" mas quem é que faz de
noiva? E uma delas, vai de noivo?". Nem vale a pena responder, nem rir,
nem chorar. A piada está gasta e já era velha quando nasceu.
O mundo tem tantas cores como os amores que existem por todo
o lado. E desabrocham na primavera, tal como um dia desabrochará uma era melhor
em que quem ama é apenas amado e alvo de amor. E assim será visto assim, apenas
assim, como um ser apaixonado. Só e apenas um ser apaixonado.
Mas que sei eu? Sou apenas uma miúda que fala demais, que
pensa demais, que se intromete demais. E isto talvez porque a felicidade dos
outros me interesse mais que a sua infelicidade. E por isso, porque o amor
também me move, serei uma voz defensora dos amores, de todos os amores, de
todas a cores, de todas as maneiras. Porque o amor é o caminho e não há outro
melhor.
Aquilo que se faz por amor está sempre além do bem e do mal.
Friedrich Nietzsche
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