Esta história ocorreu há precisamente 3 anos. Nem mais nem
menos. Fomos beber um café, eu e uma amiga que é alguns anos mais velha que eu.
Divorciada, mãe de uma criança pequena, com um ordenado que ronda os seiscentos
e poucos.Nada de extraordinário, como se vê. Uma mulher como qualquer
outra,portanto. Disse-me que me ia contar uma coisa que eu não ia gostar. No
seu trabalho, uma colega falou-lhe de um rapaz, amigo de amigo de amigo, que
fazia assim uns "favores" a mulheres jovens. Conheceu o rapaz no dia
anterior no café, através dessa colega de trabalho. Conversa curta, combinaram
a hora do dia seguinte. Nem 5 minutos demorou a conversa
-Foi constrangedor? Perguntei.
-Não, nada. Combinámos
hora e local. A minha amiga disse-me quanto é que se devia pagar pelo "serviço" e
foi assim. No dia seguinte, hora marcada e foi assim. Deixei o dinheiro no
envelope perto da mesa da saída e foi assim.
Nada de glamour, nada de hotéis de luxo, nada de preliminares,
nada de conversas românticas ou essas coisas que gostamos de apregoar para
explicar ao mundo que não é o “acto” que importa, mas sim a envolvência.
Talvez tenha dito mais duas ou frases do género, pois, ou tu é que sabes. E nada mais porque quando ficamos incrédulas de
todo, as palavras emigram para outro planeta.
A minha amiga continua minha amiga e, se voltou a recorrer a
tais “serviços" nunca mais me contou.
Mas, não deixo de pensar, que se a história se passasse com um homem que tivesse recorrido à prostituição, a minha reacção teria sido tão, mas tão diferente. A
tolerância seria zero, provavelmente tinha-o insultado, recorrido aos
argumentos da exploração de carne branca, do papel da mulher explorada e, se
nada resultasse, usaria o argumento da saúde pública. Atiraria com um "
não tens necessidade disso" e abandonaria a sala ressentida, amargurada e
a cabeça do meu amigo ficaria cheia de culpas para o próximo milénio. Mas com a
minha amiga, a minha atitude não foi assim. Embora não tenha aplaudido a sua
atitude, também não a condenei veemente como teria feito a um homem. E
concentrei-me mais na sua parte emocional e psicológica, usando todos os
clichés como " sentes-te sozinha e blá blá blá".
Por isso, passados três anos ainda me interrogo: a
prostituição tem género? Tolerei e até, sejamos francos, aceitei a atitude da
minha amiga porque para mim os homens não são explorados mas sim agraciados
pela sua masculinidade? Considerei que um homem prostituto trabalha por
"prazer"? E porque não as mulheres, se o inverso se colocar? A verdade
é que para mim, anos de pecados e tradições católicas em que Eva é a culpada de
tudo, pesam mais do que eu gosto de admitir. Deverei tomar uma atitude
repressiva perante os dois casos ou devo calar-me e remeter-me à minha condição
de " não tens nada com isso, é um negócio entre eles"? É a
prostituição um negócio? Deve-se legalizar? Como sociedade o pecado não mora ao
lado, mora no meio de nós, em cada rua e em cada esquina.O que devemos fazer ou não fazer?
Não tenho qualquer opinião formada sobre o negócio da
prostituição. É das poucas coisas que gostava de perceber melhor para poder
agir melhor. Mas uma coisa percebi: para mim a prostituição tem género. E não
gosto desta parte em mim.
E vocês caros leitores, que acham de tudo isto?