Tal como prometido no domingo passado, fui ver o filme
A Gaiola Dourada. Não fui
exactamente nesse domingo como referi na Revista de Imprensa, mas ontem. Estava
preparada para gostar e que gostei muito.
É verdade que é uma colecção de clichés, que provavelmente
alguns portugueses não são assim, mas a grande maioria cabe naquelas
descrições. O português poupado existe, o português que não gosta de ir a
restaurantes existe, a portuguesa que faz tudo pelas patroas existe, a
portuguesa que tem a casa num "brinco" existe. Como existem os filhos
que têm vergonha da família e os filhos que não toleram que tratem mal os seus
pais numa sociedade que também é a sua.
Está lá tudo, está lá toda a minha família, primos e tios,
que emigraram: os de primeira geração que trabalham sem parar, os filhos deles
que estudaram e são franceses mas a sentirem-se portugueses, e os filhos dos
filhos que não negam as origens nem a família, e têm bons cargos e bons
empregos nessa França que os acolheu. Estamos lá todos e creio até que o
realizador foi parco em clichés. Se houver uma nova gaiola dourada, deixo aqui
algumas sugestões ou clichés que são tão verdadeiros como respirar, andar ou viver.
Falta a personagem magra a quem as tias colocam logo um bom prato de comida à frente
e a quem dizem " rapariga, caredo,
estás um esqueleto. Não te dão comida lá onde tu andas"? Falta a
personagem que está mais cheiinha (posso interpretar esse papel perfeitamente)
a quem as tias dizem " estás
jeitosa". Falta o casal moderno, aquele cuja mulher diz “querido podes levantar a mesa?”, e a
quem as tias dizem " caredo, rapaz,
deixa lá isso", ao mesmo tempo que olham para a mulher com ar muito
zangado: Não foi assim que te ensinamos! Ai
caredo que estas raparigas de hoje não sabem fazer nada!
Para as minhas tias não existem direitos iguais, nem essas
modernices. Não importa o sucesso feminino se não se sabe fazer uma boa sopa da
pedra ou se se continua a chatear o rapaz que caredo, é uma jóia de pessoa. Mas para as minhas tias os homens
também não contam muito. Elas fazem o que querem, vão aos bailes que querem, reúnem-se
as vezes que querem. Deixa-os pensar que
mandam, é a regra não dita mas muito bem aplicada pela minha família.
Se pensarmos bem, a
vida dos emigrantes até pode ser uma gaiola, mas é dourada. E quem se importa
com isso se, no fim, Eusébio ainda é o rei, o Benfica é o maior clube
português, e ouve-se a Linda de Suza e a mala de cartão nesse pequeno Portugal
que fica noutro país mas não é por isso menos português. Ai caredo, que não é não.
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